27 de nov. de 2017

CONDE FAVELA CANTA MAUÁ, CONDE FAVELA COMETE O JAZZ EM SP

foto - Maristela Raineri


“Jazz é música de Preto, de Pobre... É a música da diáspora Negra, é música clássica Negra. Nós somos o Conde Favela e estamos aqui para cometer o jazz...”

Depois do aviso, um sax irrompeu com o vazio como uma trombeta xamânica a anunciar a débâcle que ali teria início. Buruga e seu sax King davam a introdução do tema “Zaíra 13” em ritmo compassado até que um trompete cheio de fúria e verso rasgaria com toda a previsibilidade de melodias óbvias. A banda acompanha em transe e a partir dali, nada mais seria o mesmo.

O Conde Favela cometeria o jazz e nas duas horas seguintes o batimento cardíaco da cidade seria alterado por conta de uma enxurrada de notas flamejantes, de um jazz seco, árido e belo, como só o Conde poderia fazer. Era o jazz de Mauá tomando conta da noite paulistana. Era a maloqueragem do abc chegando com tudo.

O Conde Favela e seu som de um milhão de toneladas começavam a atacar...

Ao som de “Equinox” de John Coltrane, com o naipe de metais formado por Mabú Reis, Edson Ikê e Buruga, o Conde trouxe todos os olhares da Boutique Vintage e Brechó Bar onde rolou o show no Belém, Zona Leste Paulistana, todos para si. Começou a hipnose de quem estava ali apenas para beber seus drinques tranquilamente, para em seguida, conhecer toda a gama dos estudos musicais do sexteto de Mauá. Algo que já vem de muito tempo.


Formado em 2009 a partir de uma dissidência da UAFRO, banda histórica do abcd, o Conde Favela começa seus trabalhos e estudos acerca da história da música negra, passando por diversas fases, indo do samba jazz ao rap, passando pelo hardbop e descambando bonito para a improvisação jazzística, dinamitando falsos mitos e outros glamoures bestas que empesteiam o jazz.

“O que percebemos que existe um desconhecimento da música, embora o Brasil seja muito musical, existe ainda uma ignorância em relação à produção de música instrumental, ao reconhecimento e perceber diferença de um sax para um trompete. O jazz principalmente tem um estigma de música sofisticada, e procuramos desconstruir esta idéia, até pelas nossas origens. Este estilo sempre foi muito combativo, questionador, que muito vezes fez frente à massificação e produtos sem alma da indústria cultural.” – Conta Edson Ikê, fundador do Conde e trompetista da banda

Alma!

Tudo que pulsa no Conde Favela é Alma. Tudo que é de verdade, tudo que vibra, tudo que as vezes pode até sangrar. Porque talvez essa seja a melhor metáfora que define o que aconteceu no show da ultima sexta. O Conde sangrou jazz lindamente por todos os poros.
Contando com a guitarra melódica da mão direita mágica de Arthur Vital e a cozinha incendiária de Alex Dias no baixo e Rafael Cab na bateria, o Conde seguiu derrubando queixos na Boutique Vintage. Temas como “Exotique” de Lee Morgan, “Backslash” ganharam toda a maloqueragem citada para ficar com a cara autoral do sexteto.

“Quintessência” do Mestre JB Meirelles foi todo samba necessário para botar o povo para chacoalhar as ancas e no final, a participação especial do músico e compositor Ba Kimbuta bota fogo geral, na noite.


Bá Kimbuta e a pancadaria sonora

Ba Kimbuta, pelas lentes de Maristela Raineri
Após o tema “Serenade To a Cuckoo”, o Conde Favela chamou ao palco o músico, rapper, produtor, compositor e percussionista Bá Kimbuta para o fecho da noite. A bordo de um tema totalmente novo de autoria de Bá que ainda nem tem um nome, o Conde improvisou, dançou, fez rap, fez samba e botou todo mundo em transe no local.

Minutos de graça, de fúria e poesia em forma de uma pancadaria sonora visceral e linda. Ao término, na saída do palco, uma frase de Edson Ikê dirigida a esse repórter, define bem o que é um show do Conde Favela.

“A gente não ta de brincadeira, Marcelo...”


Por favor, conheçam esses caras, povo...

2 de jun. de 2017

"A 13ª EMENDA" O RACISMO NO SISTEMA PRISIONAL AMERICANO



A história desse documentário começou em um verão de 1865, quando uma Nação criou uma emenda para abolir de vez a escravidão.

Decerto que na ocasião aqueles homens imaginavam estarem se livrando de um grande problema e nem de longe imaginavam que poderiam criar outro por qualquer que fosse a filigrana jurídica. Todavia, o tempo passou e agora essa Nação se encontra envolta na nova modalidade desse mesmo problema secular...

“A 13ª Emenda”, dirigido pela ótima Ava DuVernay (A mesma diretora do brilhante filme Selma) é um documentário disponível no Netflix, que vai a fundo da discussão sobre o racismo dentro sistema prisional americano.


A Gênese do Mal

Com o fim da Guerra Civil uma nova constituição é feita e nela, uma emenda foi criada para impedir que nenhum homem seja escravizado a não ser que seja um criminoso. A partir dessa condição, como diria os Racionais, surge a brecha que o sistema queria...

Sem a escravidão a economia sulista americana vai à vala com seus campos e toda manufatura que antes era escrava e gratuita indo embora. Imediatamente o dito sistema trata de começar um grande esquema de criminalização, desumanização dos Negros recém libertados para os terem de volta como escravos a trabalhar de graça em seus campos.

Começa então uma pratica que se dissemina por séculos até ter algum incomodo novamente...



Anos 60 e os Direitos Civis

Leis de direito a voto, a luta por direitos iguais, orgulho negro, Panteras Negras... Os Estados Unidos vivia em ebulição nos anos 60 com as lutas de classes e as minorias dizendo não ao que antes era corriqueiro. Os setores conservadores, assustados passam então a fazer de tudo para destruir as forças progressistas que surgiam.

A cultura do medo é implantada pelo governo Nixon em parceria nefasta com o FBI, que incute na cabeça do Americano comum, a necessidade de combater todo e qualquer manifestante. Leis são endurecidas, o país se militariza e condena aos borbotões.

Era o começo da estruturação de algo que seria muito pior com o passar das décadas. Era a hora de encher os presídios e os bolsos...


Uma Nação Atrás das Grades. Negra, Obviamente...

Em 1970 a população carcerária americana era de 357.292 presos. No ano de 2014 ela bate os 2.390.000 milhões de americanos encarcerados. Os porquês disso são explicados magistralmente em pouco mais de uma hora e quarenta de documentário.

Uma direção firme, contando com ativistas respeitados pelo mundo todo como Angela Davis, falando sobre o tema, garantem ao espectador um passeio pela história dos EUA e sua institucionalização carcerária através de uma política penitenciara escrachadamente racista, se sustentando através de vários dispositivos:

Desde o “Lei e Ordem” do governo Nixon, passando pelo nocivo “ALEC” (Conselho Americano de Intercambio Legislativo) um grupo lobista proponente de leis absurdas que entre outros, teve como cliente “CCA” (Correction Corporations of America) um grupo privatizador de cadeias, cujo lucro com o trabalho escravo realizado em presídios desde 1983 é estratosférico e mais alguns absurdos como o Projeto de Lei do Governo Clinton que injetou bilhões e bilhões de dólares em incentivo a leis perversas, lotando o país de cadeias, atendendo justamente aos privatizadores do crime...

Uma pancada!

Enquanto de cada 17 brancos, um vai a cadeia, em cada três Negros americanos, um acaba atrás das grades. O filme explica de maneira audaz e corajosa o porquê disso tudo.

“A 13ª Emenda” é um filme necessário que vasculha o que há por trás da tal “Nação Livre”. Uma Nação que não tem como ser explicada, se abandonarmos da análise a questão racial.
Assistam. 

O netflix tai pra isso...



30 de mai. de 2017

PÉRICLES CAVALCANTI, MEU VERLAINE FAVORITO AOS 70...

                                                                                                                       foto - Caroline Bittencourt


Minha história com Péricles Cavalcanti começou em uma noite de 1992...

Uma lua em que eu enchi a cara de campari e mais outras pílulas de nenhum glamour para depois ir até o apartamento dela, tentar consertar todas as cagadas de amor que fiz aos meus tenros 23 anos de idade que tinha. Cheguei e quando apertei a campainha caindo de bêbado ela atendeu e então falei tudo:

“Olha, eu não tenho a menor idéia do que será de mim, de você, de nós dois daqui uns 10 minutos, futuro sei lá. Também sei que mesmo que você acredite nisso que vou te dizer a probabilidade de eu estragar tudo brevemente é enorme porque acho que nasci para estragar tudo que me faz bem, mas enfim; A única certeza que tenho agora é que te amo profundamente. Com todas as minhas forças e as minhas “não forças”… Eu te amo!”

Parada em frente à porta do apartamento, assistindo minha performance de Bogart derrotado e bêbado, ela me disse:

“Marcelo, eu to gripada, de pijama, pantufa, meio zonza dos dois valiuns que tomei para ver se durmo e na boa; O maior interesse da minha vida hoje é minha cama. Entra que você ta bêbado, o sofá você já conhece. Tenta dormir um pouco também…”

E para arrematar:

“Vê se não faz barulho quando for pegar água na geladeira. Eu vou acordar cedo!”

Naquele momento que ela saiu eu me joguei no sofá. Além de sofrer, não me parecia ter mais nada para fazer naquela noite até que olhei para a mesa de centro e vi um livro do Paul Verlaine ao lado de um discman e um cd de nome “Canções” do Péricles Cavalcanti. Olhei para o discman que estava perto, coloquei os fones e botei o cd parar ouvir.

Sem me dar conta fui me acalmando e quando dei por mim ouvi um verso forte da música “Blues da Passagem”:

“Pra você que me pergunta/Porque estou nesta cidade/Sozinho, com um blues ao violão/Eu digo na verdade/É só por necessidade/Pois preciso da passagem de avião/Pra voltar pruma garota/Que eu deixei lá em Dakota/E que tem meu coração”

Daí pra frente a magia se fez. A dor passou um pouco, eu ouvi o cd mais umas duas vezes aquela noite e dormi muito bem. No outro dia acordei tarde e com ressaca, o amor não estava por lá, foi para a Dakota dela. Olhei para o livro do Verlaine e o abri a esmo em um poema com uma frase:

“Não há nada melhor para uma alma do que tornar menos triste outra alma”

Era isso.

De 1992 até hoje, na minha relação com a obra de Péricles Cavalcanti, ele tem sido a alma que deixa a minha alma menos triste...



EU SOU LEE SCRATCH PÉRICLES!


Reencontrei Péricles Cavalcanti cobrindo o show que comemorava seus 70 anos de idade e os seus tantos outros anos de uma carreira longa, que atravessa décadas de períodos importantíssimos da história da musica popular Brasileira.

Poeta, músico, compositor, parceiro de gente como Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, colaborador em projetos de artistas como Rogério Sganzerla, Zé Celso Martinez, sempre a frente de tudo que há do que se entende como vanguarda, não espanta vê-lo em ação novo, cheio de vigor e paixão pelo que faz. É simples de entender tudo isso.

Péricles é um homem da renascença ao mesmo tempo em que é também uma entidade xamânica que transita tranquilamente pela tradição que vem com o passado vivido nos anos 60, com a tropicália, com o role em Londres e o barato do hipismo brasileiro dos anos 70, até todo o moderno tecnológico virtual dos anos 2000, dos anos 10 desses novos 2000 e dos que chegam com eles...

Adorado pela nova geração de músicos da nova safra, Péricles Cavalcanti é a prova que esse embate entre “novo e arcaico” é uma estupidez. Ele prova que é perfeitamente possível o dialogo entre as duas partes.

No show que ele cometeu no palco do Itaú Cultural tudo isso veio à tona novamente de maneira linda...


O ILUMINAR DAS NOVAS E VELHAS ALMAS

Acompanhado de feras como Ana Karina Sebastião (Baixo), Marcelo Monteiro (Sax e flauta) e o filho Leo Cavalcanti (Vocal e pandeiro), Péricles passeou lindamente por sua obra em momentos dadivosos.

Musicas como “Cínico e Canalha” “Ser e não Ser”, “Quem Nasceu”, “Medo de Amar nº3”, “Príncipe das Marés” entre tantas outras canções já clássicas, encheu as caras que lotaram o teatro de sorrisos. Teve de tudo.

Jazz, samba, soul, funk, folk, a célula rítmica, a sincopa forte baseada no samba que origina a obra de Péricles faz com que tudo caiba. Seu enorme liquidificador antropofágico de poesia, ritmos, harmonias e outros blues, devora tudo, se alimenta de tudo e o resultado é um show rico, alegre, firme e muito feliz.

No final, em meio a abraços e carinhos de uma platéia que se recusava a ir embora, falamos um pouco de toda essa riqueza sonora.

“Para mim tudo é muito natural, coisa que trago de casa, da rádio que tanto ouvi, das cantoras, cantores que tanto amei e o resultado tai. Chego aos 70 anos muito feliz de ver tudo que fiz, de seguir fazendo tudo que faço. É um caminho muito bom”

Ao nos despedirmos, dei um abraço no Mestre e fui sem muito alarde rumo ao metrô que me devolveria a Santo André, algo que geralmente faço com pressa. Menos daquela vez; Após o show de Péricles fui para a estação Brigadeiro calmo e feliz, em passos de bolero. Era a paz.
Novamente, Péricles Cavalcanti fez minha alma mais feliz.

Meu Verlaine favorito...



Vejam um pouco de como foi... video Lidia Chaib

29 de mai. de 2017

TWO BROTHERS E OS UIVOS QUE CURAM A DOR; COISAS DO BLUES...

                                                                                                                    Foto- Pritui Pandin

Porque eu fui ver o duo Two Brothers, ontem no Apostrophe Bar?
Qual seria o apelo para a matéria? O interesse, a razão? Em 2017 o Jornalista ainda segue os acordes blues? Mas para que?
Jimmy Witherspoon foi um dos maiores cantores de blues do Arkansas, uma lenda. Um homem que dedicou sua vida às raízes da verdadeira cultura americana. No final dos anos 60 com o boom que o Blues teve por conta do interesse dos novos roqueiros ingleses, o Mestre deu uma entrevista para a BBC e a garota que o entrevistava perguntou porque da escolha em ser interprete, sem necessariamente ser músico, Jimmy respondeu:
“Oras, tocar blues é fácil. Qualquer um pode tocar. Mas para cantar isso... O canto vem da coisa de interpretar um Blues como se deve, algo que eleva o sujeito ao ápice da condição humana, uma coisa que eu não posso te explicar, mas que sinto. Blues não é que se explica, Blues é o que se sente”
Em tese é isso.
Blues é algo que vai além da música. É um estado supremo, divino que extrapola tudo isso. É o veneno que cura a dor. E para entender isso tem que ter sentimento.
Precisa conhecer o mundo, a vida, os guetos, os pardieiros, o amor e as dores do mesmo. Precisa saber das benesses que podem existir num vômito em um banheiro sujo na alta madrugada de um duvidoso boteco, de uma improvável cidade qualquer. Um lugar que só existe para aqueles que sabem apreciar a última gota da garrafa de uísque comprado a parcas moedas.
Um grande blues só pode ser tocado por aqueles que vivem na exceção do que é apenas convencional.
Andre Calixto e Ninho Vilela sabem disso tudo. E por isso fui vê-los cometer o blues na noite...



A Dupla

Conheci André Calixto em um tempo onde os sons eram vários.

Começo dos anos 90 éramos dois garotos descobrindo o rock, o samba, o soul, o jazz, o blues e a vida. Conversas de horas na banca do Tonho e do Chico em Santo André, cervejas e mais cervejas em voltas pelos bares da Bernardino de Campos e uma amizade de 25 anos.

O amigo hoje é músico experiente a frente de projetos dos mais variados como seus estudos em moda de viola, sambas antigos, musica oriental e a reconhecidissima Nomade Orquestra. Foi ele que me contou da ideia de formar o Two Brothers:

“Sempre falei muito com o Ninho sobre sons e parcerias e efetivamente mesmo nunca havíamos feito nada. A ideia do Duo nasceu porque eu saquei que esse formato, com Cordas e sopros não era dos mais convencionais e a possibilidade de criar a partir daí me parece algo bem bacana”

Do lado nosso, Ninho Vilela nos acompanha na conversa...

Falar que a guitarra de Ninho tem única e tão somente timbre é um erro; Sua guitarra não reproduz timbragens, mas sim, estados puros de espírito e encanto.

Ninho Vilela desde sempre é o cara do abcd que melhor entende a essência disso que é o blues. Um sentimento que escorre por cordas de aço e arame em noites apocalípticas onde as coisas da vida fogem à razão.

Não estamos falando do mundinho cartesiano, careta, de formadores de opinião apenas óbvios. Falamos de Blues. Nesse universo, tanto quanto o que o cara realiza como homem, como artista, como músico, importa a paixão. Vale a insana e deliciosa experiência de viver a vida de maneira intensa, como se todo dia fosse o último.

Dessa paixão, Ninho entende. É com ela que ele começa a cometer o som ao lado de Calixto.


A Hora que o Blues Acontece

Equinoxx de John Coltrane, temas de Little Walter, Lou Donaldson e afins foram interpretados com força, criatividade e uma boa dose de abuso em desconstruir clássicos absolutos para se encontrar as versões que mais se identificam com a cara do Duo.

Atrás da meia luz do Apostrophe Bar, num emaranhado de conversas esparsas e outras microfonias, dois músicos ousaram flertar com o que se tem mais mítico, épico e espiritual das encruzilhadas da vida e dos sons.

Acompanhados da participação pra la de especial de Luiz Galvão (Otis Trio, Nomade Orquestra), com violões, gaitas, guitarras e Sax, o Two Brothers experimentou os melhores venenos sonoros, as únicas receitas pra cortar as dores óbvias.

Foi pouco mais de uma hora e meia em que os coiotes noturnos uivaram pelos cantos e becos escuros do que se imagina como noite. O show do Two Brothers, mais que do que recomendável é uma experiência necessária que nem cobra muito de quem pensa em vivê-la.

Basta ter coração. Parem um pouco, dêem uma chance ao lirismo e o estado lúdico de uma nota da guitarra de Ninho Vilela e das lágrimas que saem como notas das gaitas de André Calixto e garanto a vocês:



As suas noites serão muito mais agradáveis...

22 de mai. de 2017

GIANT JELLYFISH; A BANDA DE ROCK QUE ACORDA A CIDADE

                                                                                                                       Foto - Leandro de Villa

Na noite de sábado, decidi ir a pé até o Cactus, em Santo André, onde haveria a pauta da vez...
No caminho até o bairro do Bangu, durante os 30 minutos que andei entre minha casa e la, vi a noite ser nostálgica, mantendo os ares da província que Santo André ainda é, e que a gente insiste em refutar, em dizer não é mais assim. Todavia, as portas fechadas de todos os comércios da rua oratório, mais o silêncio das casas e dos becos, se faziam por afirmar:
Santo André, ainda tem sua porção provinciana.
Mas não é de todo ruim...
O tempo das horas nas províncias é mais lento, a bruma é erma e uma boa caminhada clareia bem o que se quer, o que se pensa, o que se deseja.
Naquela noite, por exemplo, eu queria ver uma banda de rock. E quando o Giant Jellyfish ligou seus amplificadores para cometer o rock eu vi. Caras, eu vi uma banda de rock...


TEKA E OS MENINOS ROQUEIROS...

Quando cheguei no Cactus fui recebido pelo forte abraço e pela Heineken gelada do amigo Álvaro. Entre um gole e outro Teka Almeida chegou.
Menina de rosto meigo, com jeito de personagem de um livro do Herman Hesse, delicada e quase tímida, foi ela que me ajudou a chamar os outros meninos que forma a Giant Jellyfish; Rafa Almeida, Leandro de Villa e Tiba. Sentamos em uma mesa e batemos um papo pouco antes de tudo começar.
Entre risos, um tanto tímidos, no começo um pouco nervosos, eles me falaram de suas composições, a forma como trabalham as músicas. Me contaram o quanto se divertiam com a banda, com o lance de sair por ae a mostrar o trabalho e que estavam gostando muito disso.
Decidi não alongar muito a coisa. Faltava pouco tempo para a o show começar e então os deixei a vontade. E quando veio os primeiros riffs de “Repentant Dog” nada mais foi como antes na noite Andreense.
A província acordou! O Giant Jellyfish entrava em ação...


UMA CHICOTADA DE ROCK’S NA NOITE ANDREENSE...

Esqueçam o rosto que era tão somente meigo, que eu lhes falei!
Quando o jorro de riffs da guitarra poderosa de Rafa Almeida, preenche todo o espaço possível, Teka inicia uma performance de palco forte, poderosa, uma entidade xamânica a acompanha enquanto ela desce a mão em seu teclado para abrir o show uma paulada sonora, um hardão de fazer jus a Free, Hot Tuna e afins.
A banda abre o show para acabar com tudo que se pretendia em se tratando de ermo e apenas sossegado...
O Giant Jellyfish sobe ao palco para acabar com o sossego dos acomodados. Era a hora do rock rolar e não ia ser pouco...


EM TRANSE...

“Choices” um folk com ares de anos 90, ou, o folk rock possível para os anfetaminicos anos 90, um som cheio de guitarra, microfonia, distorção e o diabo, é vociferado por Teka. Um tempo em que todos os queixos caem, todos os drinks ficam suspensos.
Impossível não para ver os garotos cometendo o rock.
A catárse segue. “Smokey Mary”, “Knifes Cutting Edge”, “Emotional Rollercoaster”, “Dusting Dreams”, “Run Away Baby”, “Live Long Enough”… Todas! Não da para pegar uma, ou duas, ou quarto músicas para destacar. O show todo do Giant foi absurdo de bom!
Um transe pleno, comandado por uma enxurrada de riffs em fúria de Rafa Almeida, slaps de Tiba e todo vigor da bateria de Leandro de Villa... Os garotos encantaram toda a platéia que esteve no Cactus no sábado à noite.
No final, meio que atordoado saí sem me despedir da rapaziada, decidi fazer o mesmo caminho a pé pelos 30 minutos que me separavam da minha casa. E sem perceber, eu tinha um riso na cara. Devo ele ao show do Giant Jellyfish.

Um puta Show!